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Como emenda do 'orçamento secreto' apoiada por Hugo Motta foi parar em obra com produto de trabalho escravo

Trabalhador é resgatado em pedreira na Paraíba após ser submetido a condições análogas à escravidão. A investigação revela vínculos entre os recursos públicos para pavimentação e a exploração da mão de obra em obras municipais.

Cláudio, 57 anos, tem quase cinquenta anos de experiência no corte de pedras. Após aprender com seus pais, trabalhou na Paraíba, onde foi contratado por uma pedreira sem treinamento ou equipamentos de proteção.

Cláudio e seus colegas viviam em condições degradantes: alojados em barracos improvisados, sem banheiro, e com comida exposta ao ar livre. Em junho de 2024, ele e outros três trabalhadores foram resgatados pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que autuou a pedreira por manter trabalhadores em condições análogas à escravidão.

As pedras cortadas por Cláudio integraram o maior projeto de pavimentação da cidade vizinha, Juazeirinho, apoiado pelo deputado federal Hugo Motta (Republicanos-PB). Os recursos oriundos de uma emenda de relator, parte do orçamento secreto.

Após ações do Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso começou a divulgar os nomes de parlamentares que indicam emendas. Os ofícios solicitando os recursos foram enviados por Hugo Motta e pelo senador Veneziano Vital do Rego (MDB-PB).

Cláudio relata que o responsável pela pedreira, Haroldo dos Santos Alves, não lucrou e afirmou que os ganhos foram destinados à Construtora Realizar, contratada pela prefeitura. A construtora, apesar de não estar na lista suja, recebeu um contrato de R$ 1,9 milhão da prefeitura para obras de calçamento.

Enquanto Haroldo foi autuado, a prefeitura de Juazeirinho ficou sem punição, embora o relatório do MTE afirmasse que toda a produção da pedreira era destinada à pavimentação da cidade. A prefeita Anna Virgínia Matias reconheceu os esforços do deputado Motta.

Em 2024, a popularidade de Motta disparou na cidade: de apenas 17 votos em sua primeira eleição para mais de 4,5 mil votos em 2022. A parceria política entre a prefeita e o deputado rendeu elogios mútuos.

O cientista político Marco Antonio Carvalho Teixeira critica a falta de critérios na alocação de recursos por emendas, enquanto a especialista Lívia Miraglia pede que a responsabilização se estenda a toda a cadeia produtiva, incluindo políticos que se beneficiam economicamente.

A prefeitura de Juazeirinho alegou que recebeu a informação sobre a pedreira com "grande preocupação" e considera implementar cláusulas contratuais para melhorar a fiscalização. A Caixa Econômica Federal notificou o município para que tome as providências necessárias.

A BBC News Brasil investiga a relação entre trabalho escravo em pedreiras e obras públicas, mapeando casos similares em oito estados desde o fim de 2024.

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